O que é Geração Distribuída
Resumidamente, um projeto de Geração Distribuída está fundamentado em avaliações técnicas e financeiras, no atendimento à regulamentação vigente e pela gestão operacional do sistema instalado. A ANEEL, por meio da Resolução Normativa n° 687/2015, dá orientações de natureza técnica e operacional, principalmente no que tange ao acesso, ou conexão, do novo sistema à rede das concessionárias.
Poderíamos, para efeito de melhor entendimento, elencar os principais documentos básicos de estudo para o desenvolvimento de um projeto de GD:
1. Resolução Normativa n° 482/2012 da ANEEL;
2. Padrão Técnico de micro e minigeração da Concessionária de Energia local (disponíveis nos
sites das concessionárias);
3. Módulo 3 do PRODIST – Procedimentos de Distribuição
de Energia Elétrica no Sistema Elétrico Nacional;
4. Literatura especializada de engenharia de energia e geração distribuída;
5. Caderno Temático de Micro e Mini Geração
Distribuída ANEEL.
Micro e Minigeração
A micro e a minigeração distribuída consistem na produção de energia elétrica a partir de pequenas centrais geradoras que utilizam fontes renováveis de energia elétrica ou cogeração qualificada, conectadas à rede de distribuição por meio de instalações de unidades consumidoras.
Para efeitos de diferenciação, a microgeração distribuída refere-se a central geradora de energia elétrica, com potência instalada menor ou igual a 75 kW e que utilize cogeração qualificada, conforme regulamentação da ANEEL, ou fontes renováveis de energia elétrica, conectada na rede de distribuição por meio de instalações de unidades consumidoras. Já a minigeração distribuída diz respeito às centrais geradoras com potência instalada superior a 75 kW e menor ou igual a 5 megawatt (MW), e que utilize cogeração qualificada (conforme regulamentação específica ANEEL) ou fontes renováveis de energia elétrica.
Procedimentos de
acesso à rede
Em primeiro lugar, é importante compreender o que é “acesso à rede”. Se olharmos na maioria das ruas das regiões urbanas, vamos identificar quilômetros e mais quilômetros de linhas elétricas responsáveis por transportar energia de uma fonte geradora até os consumidores. A energia das linhas de distribuição que observamos nas ruas das cidades já passou por diversas transformações, de forma a garantir a qualidade necessária aos consumidores. Nessas linhas de distribuição, comumente chamadas de rede de distribuição de energia, são conectados os consumidores. Os consumidores, por assim dizer, são residências, comércios, indústrias e tantos outros que têm equipamentos elétricos (máquinas, lâmpadas, aquecedores, etc.) que necessitam de energia elétrica para funcionar.
Acredite se quiser, até certo ponto podemos afirmar que “quase todos os consumidores e geradores do Brasil estão interconectados”, pelo que chamamos de Sistema Interligado Nacional (SIN).
Ainda que o SIN se refira, a priori, à interconexão dos geradores (hidrelétricas, termelétricas e usinas eólicas) e as linhas de transmissão, é válido estender sua validade às redes de distribuição, resultantes dos centros de transformação de energia para locais de alta concentração populacional. Assim sendo, qualquer consumidor que queira se conectar a esta rede, seja em uma instalação residencial nova ou para instalação de um gerador próprio, deverá atender a procedimentos mínimos para solicitar o acesso à rede de distribuição local, padronizado pela concessionária de energia da sua região/cidade.
A seção 3.7 do Módulo 3 do PRODIST estabelece os procedimentos para acesso de micro e minigeração distribuída ao sistema de distribuição.
Para que a central geradora seja caracterizada como micro ou minigeração distribuída, são obrigatórias as etapas de solicitação e de parecer de acesso. A solicitação de acesso é o requerimento formulado pelo acessante (consumidor), e que, uma vez entregue à acessada (distribuidora), implica a prioridade de atendimento, de acordo com a ordem cronológica de protocolo.
A solicitação de acesso deve conter o Formulário de Solicitação de Acesso para micro e minigeração distribuída, disponíveis nos Anexos II, III e IV da seção 3.7 do Módulo 3 do PRODIST, determinados em função da potência instalada da geração.
O formulário específico para cada caso deve ser protocolado na distribuidora, acompanhado dos documentos pertinentes, não cabendo à distribuidora solicitar documentos adicionais àqueles indicados nos formulários padronizados.
Conforme estabelecido na seção 3.7 do Módulo 3 do PRODIST, o procedimento de acesso é simples e rápido, assim como os requisitos de proteção necessários para garantir a segurança das pessoas e a qualidade da energia injetada na rede.
A figura abaixo ilustra as etapas e prazos do procedimento de acesso que devem ser seguidos pelo consumidor (destacados em azul) e pela distribuidora (destacados em vermelho).
Fonte: ANEEL, “Cadernos Temáticos ANEEL – Micro e Minigeração Distribuída – Sistema de Compensação de Energia Elétrica”, 2ª edição, 2016.
É compulsória a contratação de profissional ou empresa especializada de forma a atender as especificações técnicas, e de modo a garantir a segurança e otimização operativa do gerador a ser instalado.
Sistema de medição: energia consumida e energia gerada
Nas instalações sem geração distribuída, há necessidade somente de medidores da energia que foi consumida pela instalação. Contudo, caso haja a instalação de um gerador, para que a energia gerada seja medida pela concessionária de energia e sejam contabilizados os créditos ou, por exemplo, para que seja rateado o excedente entre outros consumidores constantes em contrato de geração compartilhada, faz-se necessária a instalação de um sistema de medição que também quantifique a energia que foi gerada, isto é, que foi injetada na rede de distribuição.
De acordo com a ANEEL, o sistema de medição deve atender às mesmas especificações exigidas para unidades consumidoras conectadas no mesmo nível de tensão da microgeração ou minigeração distribuída, acrescido da funcionalidade de medição bidirecional de energia elétrica (medição de consumo e de geração).
É importante salientar que a distribuidora é responsável por adquirir e instalar o sistema de medição, sem custos para o acessante no caso de microgeração distribuída, assim como pela sua operação e manutenção, incluindo os custos de eventual substituição.
No caso de conexão de minigeração distribuída, o acessante é responsável por ressarcir a distribuidora pelos custos de adequação do sistema de medição, nos termos da regulamentação específica.
Sistema de Compensação de Energia Elétrica: como funciona?
Uma dúvida frequente é a de se quem instalou um micro ou minigerador, sob a resolução normativa 687/2015 da ANEEL, pode vender a energia excedente, como ocorre em outros países. A resposta é não, pelo menos por enquanto. O que existe no Brasil é o Sistema de Compensação de Energia Elétrica, conhecido também como Net metering. Este instrumento contratual com a concessionária, ao invés de permitir a venda da energia que foi injetada na rede, garante ao gerador créditos (iguais à diferença da energia gerada – energia consumida) que podem ser utilizados conforme determinados critérios e em um certo período.
Quando a energia injetada na rede for maior que a consumida, o consumidor receberá um crédito em energia (em kWh) a ser utilizado para abater o consumo em outro posto tarifário (para consumidores com tarifa horária) ou na fatura dos meses subsequentes. Os créditos de energia gerados continuam válidos por 60 meses.
Há ainda a possibilidade de o consumidor utilizar esses créditos em outras unidades previamente cadastradas dentro da mesma área de concessão e caracterizada como autoconsumo remoto, geração compartilhada ou integrante de empreendimentos de múltiplas unidades consumidoras (condomínios), em local diferente do ponto de consumo, definidas da seguinte forma:
- Geração compartilhada: caracterizada pela reunião de consumidores, dentro da mesma área de concessão ou permissão, por meio de consórcio ou cooperativa, composta por pessoa física ou jurídica, que possua unidade consumidora com microgeração ou minigeração distribuída em local diferente das unidades consumidoras nas quais a energia excedente será compensada;
- Autoconsumo remoto: caracterizado por unidades consumidoras de titularidade de uma mesma Pessoa Jurídica, incluídas matriz e filial, ou Pessoa Física que possua unidade consumidora com microgeração ou minigeração distribuída em local diferente das unidades consumidoras, dentro da mesma área de concessão ou permissão, nas quais a energia excedente será compensada;
- Empreendimento com múltiplas unidades consumidoras (condomínios): caracterizado pela utilização da energia elétrica de forma independente, no qual cada fração com uso individualizado constitua uma unidade consumidora e as instalações para atendimento das áreas de uso comum constituam uma unidade consumidora distinta, de responsabilidade do condomínio, da administração ou do proprietário do empreendimento, com microgeração ou minigeração distribuída, e desde que as unidades consumidoras estejam localizadas em uma mesma propriedade ou em propriedades contíguas, sendo vedada a utilização de vias públicas, de passagem aérea ou subterrânea e de propriedades de terceiros não integrantes do empreendimento.
A leitura atenta da Resolução Normativa 687/2015 e das possibilidades elencadas acima permite vislumbrar cenários diversos em que:
- Geração compartilhada: possibilidade de negócios estratégicos para diferentes empresas ou grupo de cooperados, em que modelos contratuais específicos podem garantir o aluguel (leasing) de parte da unidade de geração, mediante parcela (rateio) de energia acordada em contrato;
- Autoconsumo remoto: grandes redes de lojas, hotéis, instituições educacionais (universidades, escolas), postos de abastecimento e afins, podem se beneficiar de instalações existentes numa mesma área de concessão e utilizar a energia excedente gerada em um dado local para outras instalações sob o mesmo CNPJ;
- Condomínios residenciais e comerciais: possibilidade de ação conjunta para geração distribuída e rateio, mediante avaliação específica, para o compartilhamento dos créditos a serem gerados, para os condôminos e para a área comum do empreendimento.
Análise da viabilidade econômica
Muitos aspectos contam na hora de avaliar economicamente um projeto de Geração Distribuída. Detalhes operacionais, da tarifação de energia local, da vida útil dos equipamentos, das taxas consideradas e outros parâmetros interferem, diretamente, nos resultados dos principais indicadores: tempo de retorno (payback), valor presente líquido (VPL) e taxa interna de retorno (TIR).
Infelizmente, os diferentes fornecedores possuem parâmetros distintos em relação aos aspectos de avaliação econômica, o que pode descaracterizar um projeto por completo. Se por um lado a engenharia de projeto (seja solar, eólica ou outra) segue critérios bem definidos no dimensionamento de um sistema, a engenharia econômica lança mão de estimativas às vezes um tanto subjetivas, que se não estiverem bem embasadas podem mascarar a real viabilidade do empreendimento. Dado um mesmo sistema, não é difícil de encontrar prestadores de serviço que avaliem um projeto com payback de X anos, e outra empresa avalie o mesmo projeto a um payback de X+5 anos. Isto é algo crítico, e precisa ser muito bem investigado, principalmente, pelo investidor.
Todavia, há alguns elementos que têm maior peso ao se realizar a avaliação econômica do projeto. Um deles é a vida útil dos equipamentos. Outro, no caso específico da energia fotovoltaica, é a taxa de depreciação das placas solares. Um índice válido, porém que é preciso ser muito bem estimado, é a inflação energética projetada.
O apresentado acima resume bem o desafio da análise do real preço da energia a ser considerado, levando em conta, inclusive, o Estado que se encontra o empreendimento a ser projetado/instalado.
Apesar de todos os desafios de uma “unificação de critérios” econômicos avaliatórios de um projeto de GD, o Brasil e o mercado internacional têm observado, com o passar dos anos, a queda de preços de equipamentos e o surgimento de mais mão-de-obra especializada, que resultam na redução do preço final de implantação de um projeto. Como exemplo, o próximo gráfico apresenta os preços praticados na Alemanha para sistemas solares fotovoltaicos ao longo dos últimos anos, e apontam para uma redução acentuada para o futuro.
Fonte: CRESESB, “Manual de Engenharia Fotovoltaica”, 2014.
O preço normalizado (R$/Wp) no Brasil também tem sofrido quedas acentuadas, e varia conforme aumenta a potência a ser instalada (próxima figura).
Fonte: EPE, “Energia Renovável”, 2016.
Apesar da queda do preço dos sistemas instalados conforme o aumento da potência, observa-se uma variação significativa, resultado de um mercado ainda em fase de consolidação, porém em franco crescimento.
É importante ressaltar, porém, que os gráficos acima ilustram somente a situação da energia solar fotovoltaica. A viabilidade da energia solar vai variar conforme a irradiação solar local e outros fatores. A escolha por energia eólica, biomassa/biogás, cogeração ou uma central hidrelétrica é uma etapa fundamental para a viabilização do projeto, que levará em conta os preços da tecnologia, seu potencial de geração e outros aspectos importantes.
Conclui-se, portanto, que uma avaliação econômica confiável demanda uma empresa e/ou profissionais qualificados e especialistas no setor, visando garantir, com alta confiabilidade, quais os riscos e benefícios do projeto.
Incentivos tributários
Talvez o item mais importante na avaliação econômica seja o valor da tarifa (preço da energia) a ser utilizado, uma vez que há elementos tributários importantes a considerar, vez sim e vez não, na conta. A ANEEL resume bem este assunto, apesar de salientar que a definição sobre a cobrança de impostos e tributos federais e estaduais foge das competências da ANEEL, cabendo à Receita Federal do Brasil e às Secretarias de Fazenda Estaduais tratar da questão. A seguir, são apresentadas informações relativas ao ICMS e PIS/COFINS:
- ICMS: o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS é um tributo Estadual aplicável à energia elétrica. Com respeito à micro e minigeração distribuída, é importante esclarecer que o Conselho Nacional de Política Fazendária – CONFAZ aprovou o Convênio ICMS 6, de 5 de abril de 2013, estabelecendo que o ICMS apurado teria como base de cálculo toda energia que chega à unidade consumidora proveniente da distribuidora, sem considerar qualquer compensação de energia produzida pelo microgerador. Com isso, a alíquota aplicável do ICMS incidiria sobre toda a energia consumida no mês.
Após interações da Agência com o Ministério da Fazenda, Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, Ministério de Minas e Energia e com o Congresso Nacional, o Conselho Nacional de Política Fazendária – CONFAZ publicou o Convênio ICMS 16, de 22/4/2015, que revogou o Convênio ICMS 6/2013 e autorizou as unidades federadas a conceder isenção nas operações internas relativas à circulação de energia elétrica, sujeitas a faturamento sob o sistema de compensação de energia. Dessa forma, nos Estados que aderiram ao Convênio ICMS 16/2015, o ICMS incide somente sobre a diferença entre a energia consumida e a energia injetada na rede no mês.
Os Estados que aderiram ao convênio são: Acre, Alagoas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Rondônia, Roraima, São Paulo, Sergipe, Tocantins e o Distrito Federal. É importante ressaltar que esta lista pode ser atualizada mediante a adesão de outros Estados.
Para aqueles Estados que não aderiram ao novo Convênio, mantém-se a regra anterior, na qual o ICMS é cobrado sobre todo o consumo, desconsiderando assim a energia injetada na rede pela micro ou minigeração.
- PIS/COFINS: com relação à apuração do Programa de Integração Social – PIS e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – COFINS, não existia até outubro de 2015 uma legislação ou orientação da Receita Federal esclarecendo como deveria ser realizada a cobrança para os casos de micro e minigeração distribuída.
No entanto, com a publicação da Lei nº 13.169/2015, de 6/10/2015, resultado de várias gestões da ANEEL junto ao Ministério de Minas e Energia e ao Ministério de Planejamento, Orçamento e Gestão, a incidência do PIS e COFINS passou a acontecer apenas sobre a diferença positiva entre a energia consumida e a energia injetada pela unidade consumidora com micro ou minigeração distribuída. Tendo em vista que o PIS e a COFINS são tributos federais, a regra estabelecida pela lei vale igualmente para todos os Estados do país.
Por onde começar?
Depende! Um projeto de Geração Distribuída é composto por desafios únicos, porém tem vários pontos de partida e pode ser determinado por diversas características.
Um capital para investimento é sempre uma forma de iniciar qualquer empreendimento. Porém, também é possível desenvolver um projeto de GD sem ter que despender nenhum investimento inicial. No caso da GD, este capital é avaliado concomitantemente às possibilidades tecnológicas existentes, de modo a se avaliar o retorno proposto. Outro ponto de partida pode ser uma condição de suprimento necessária, geralmente imputada pelo consumidor (energia gerada deve ser igual à energia consumida, por exemplo). Para certas fontes, como a solar ou eólica, aspectos físicos e estruturais podem ser limitantes muitas das vezes.
Apesar de tantos detalhes, a GD tem se tornado, a cada dia, uma grande menina dos olhos do Brasil. Seu potencial de investimentos é bilionário, e seu crescimento tem sido exponencial. Cabe a você dar o primeiro passo!